Portugal: Contratos à Distância e Fora de Estabelecimento – Novidades que convém não ignorar…

A ACOP – Associação de Consumidores de Portugal –, com sede em Coimbra, é uma instituição de consumidores para consumidores e com consumidores (de carne e osso, não com meras ficções para ludibriar os papalvos que se põem sempre a jeito…).

De âmbito nacional, intervém em todo o território. De interesse genérico, abarca os temas que importam ao consumidor, sem exclusões.

A ACOP alerta, por nosso intermédio, como o fará por outros meios, para a nova lei dos contratos à distância e fora do estabelecimento comercial publicada a 14 de Fevereiro de 2014 (DL 24/2014).

A lei vigora desde 13 de Junho próximo passado.

Nem todos os contratos à distância se submetem a esta lei.

Excluem-se, entre outros, os de:

. serviços financeiros

. construção, de reconversão substancial, compra e venda ou outros direitos respeitantes a imóveis, incluindo o arrendamento

. serviços sociais, nomeadamente no sector da habitação, da assistência à infância e serviços dispensados às famílias e às pessoas com necessidades especiais permanentes ou temporárias, incluindo os cuidados continuados;

. serviços de cuidados de saúde

. jogos de fortuna ou azar, incluindo lotarias, bingos e atividades de jogo em casinos e apostas

. viagens turísticas (viagens sob medida e viagens organizadas)

. timeshare e produtos  de férias de longa duração

. fornecimento de géneros alimentícios, bebidas ou outros bens destinados ao consumo corrente do agregado familiar, entregues fisicamente pelo fornecedor de bens em deslocações frequentes e regulares ao domicílio, residência ou local de trabalho do consumidor

. transporte de passageiros

 

As novas regras reforçam, em princípio, a protecção do consumidor, no desequilíbrio de posições a que e assiste, entre fornecedores e consumidores.

Desde logo, com mais deveres de informação, a cargo do fornecedor, na fase anterior à da celebração do contrato (informação pré-contratual).

É ao fornecedor que compete prestar a informação. Não ao consumidor a exigi-la.

A informação tem de ser prestada em tempo útil (pré-contratual) de forma clara e compreensível.

Impondo-se, como se tem por elementar, a observância da boa-fé: lograr atingir tanto os interesses que as partes tiveram em mira ao celebrar o contrato, como a confiança suscitada pelo sentido global das cláusulas contratuais, pelo processo de formação do contrato singular, pelo seu teor e ainda pelos mais elementos atendíveis.

O silêncio do consumidor, em qualquer circunstância, não pode valer como consentimento para que se considere o contrato feito. Tem de haver consentimento expresso.

Os contratos fora do estabelecimento comercial, independentemente do seu valor, têm de ser celebrados por escrito, sob pena de não valerem, de não serem válidos.

É obrigatória a entrega ao consumidor de uma cópia em papel ou noutro suporte duradouro, como o CD – ROM, o DVD, os cartões de memória, o correio electrónico, ou qualquer outro.

Nos contratos pelo telefone, deve logo no começo ser explicitamente comunicado o objectivo comercial da chamada.

O consumidor só fica obrigado pelos termos do contrato depois de assinar a oferta ou enviar o seu consentimento escrito ao fornecedor.

O fornecedor tem o dever de informar o preço total do bem (em que se incluem todos os impostos, taxas e encargos), os meios de pagamento aceites e outras informações adequadas.

O SPAM (as comunicações não solicitadas) é proibido sempre que os destinatários sejam pessoas singulares,  pessoas físicas. Quer se trate de correio electrónico, de chamada telefónica, de telecópia,  SMS, MMS, EMS…

Se o contrato for celebrado pela Internet, o fornecedor tem a obrigação de informar da existência de restrições geográficas ou outras relativas à entrega, quer dizer, se há ou não zonas do território onde não há distribuição dos bens, etc. E ainda quanto aos meios de pagamento aceites, bem como das medidas de protecção técnica existentes.

Nestes contratos, a lei dá ao consumidor um direito de desistência (há quem lhe chame também de arrependimento) porque o negócio não é feito com a necessária ponderação na ausência física dos contraentes, fornecedor e consumidor.

O prazo para o exercício do direito de desistência pelo consumidor é de 14 dias seguidos.

O consumidor pode agora usar de qualquer meio para dar a saber da sua desistência: carta, email, telecópia, etc. Mas tem de ficar com cópia de que remeteu ao fornecedor tal comunicação para poder provar, se for caso disso, que desistiu.

Pode exercer também o seu direito de desistência por meio de um formulário, que a lei agora traz em letra de forma, e que terá de ser remetido ao fornecedor dentro do prazo indicado.

Todavia, se o fornecedor não cumprir o dever de informação relativo ao direito de desistência, a lei concede agora ao consumidor prazo muito maior para o efeito – para poder desistir do contrato: passa a dispor de 12 meses para o efeito; 12 meses a contar do termo do prazo inicial de 14 dias.

O consumidor tem o direito de inspeccionar e manipular o bem, sempre que o queira, com a prudência requerida.

Ficam ainda expressamente proibidos, como já resultava da lei em geral, os contratos forçados (e a cobrança dos serviços respectivos): contratos forçados de água, gás, electricidade, aquecimento urbano, conteúdos digitais…

Repare-se, pois: os contratos de fornecimento de água não poderão ser impostos aos consumidores. Os consumidores só os celebrarão se o quiserem.

O consumidor não pode renunciar a tais direitos. Os direitos dos consumidores são, pois, neste sentido, irrenunciáveis, não podendo os fornecedores exercer qualquer pressão com o fito de obterem vantagens contrárias às que a lei proíbe…

Se o fizerem responderão por isso.

 

Uma nota final: o consumidor com esta lei perde direitos – caso desista do contrato, cabe-lhe, em princípio, suportar os fretes da devolução dos bens.

Só não suportará tais custos se o fornecedor nada disser ao consumidor ou se os bens tiverem dimensões anormais que não possam ser regularmente devolvidos.

Novos direitos, novas obrigações. Em especial a de terem acesso a informação simples, descodificada para que o exercício dos direitos esteja ao alcance de cada um e todos, de forma nada intrincada nem complicada.

Transparente como a água lusa, a água não poluída…

Porque a hipertrofia da informação (a informação em excesso, em demasia, em quantidades anormais ou nada transparente) equivale, afinal, a informação nenhuma. Com o que se ilude o consumidor e se preclude o seu direito.

 

Mário Frota

Director do Centro de Estudos de Direito do Consumo de Coimbra

Presidente da apDC

Presidente do Conselho Diretor da Revista Luso-Brasileira de Direito do Consumo